Aprovado edital de leilão que pode gerar economia de R$ 10, 5 bi para setor elétrico – Valor – 16/04/14

Comentário: Caramba! Que ótimo! Tiraram o Bode da Sala e nos colocaram em Las Vegas!

Depois de tantas trapalhadas, o leilão anunciado só irá minorar o prejuízo do consumidor perante as confusões do próprio modelo. Portanto, vamos devagar com o andor ao elogio dessa medida, pois, na realidade ele é a cristalização de um fracasso total do modelo brasileiro.

Poderíamos abdicar da nossa atávica complacência e perguntar às autoridades:

  1. Existe algum mercado de energia onde o preço spot permaneça no entorno de US$ 400/MWh mesmo com a informação das autoridades de que “o sistema está em equilíbrio”?
  2. Se não existe algo semelhante, qual é o diagnóstico que aponta porque isso ocorre aqui?
  3. Se o Custo Marginal de Expansão está no entorno de R$ 120/MWh, qual é a grande façanha de se assinar contratos de 5 anos por um valor 150% maior do que o custo de expandir o sistema?
  4. Há sentido em ter usinas antigas vendendo energia a R$ 10/MWh e outras, também antigas vendendo a R$ 271/MWh?
  5. O atingimento do efeito MP 579 para as usinas funciona como uma “varinha de condão”, onde, de repente, o preço da energia cai bruscamente?

Daniel Rittner

O leilão do governo para salvar as contas do setor elétrico em 2014 pode gerar economia de até R$ 10,5 bilhões se for bem-sucedido, conforme as tarifas máximas estipuladas ontem pelo Ministério de Minas e Energia. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou o edital do certame, marcado para o dia 30 de abril, que tem como objetivo eliminar ou reduzir o volume de eletricidade que está descontratado pelas distribuidoras. Para atrair as geradoras, o governo fixou um preço-teto que foi recebido favoravelmente pelo mercado, embora sem entusiasmo. Há apostas de forte participação das estatais, como a Petrobras, mas não se sabe ainda se isso será suficiente para garantir o êxito completo do leilão.

Para completar o suprimento de energia aos seus consumidores, as distribuidoras têm recorrido ao mercado de curto prazo, onde o megawatt-hora é negociado com preço recorde de R$ 822,83 desde o início de fevereiro. É o que se chama de “exposição involuntária” das distribuidoras. A grande incógnita do leilão – o preço-teto do megawatt-hora a ser vendido pelas geradoras – foi resolvida ontem: a Aneel, por determinação do ministério, fixou esse valor em R$ 271 para os contratos por quantidade (que são contínuos) e em R$ 262 para os contratos por disponibilidade (as usinas só precisam estar disponíveis quando chamadas a operar).

Em dezembro, no último leilão de energia realizado, o governo havia fixado a tarifa máxima em R$ 192 por megawatt-hora. Esse preço não foi capaz de seduzir os donos de usinas e provocou um “buraco” de 3,3 mil megawatts médios, que as distribuidoras precisam fechar indo ao mercado “spot”.

Caso o leilão seja bem-sucedido e consiga contratar todo esse volume, a economia das distribuidoras – cujas despesas têm sido arcadas por aportes do Tesouro e empréstimos da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) – pode chegar a R$ 10,5 bilhões neste ano. É a diferença, apenas no que resta de 2014, entre os preços pagos atualmente no mercado de curto prazo e a tarifa-teto do novo leilão. Os contratos oferecidos para as geradoras que entrarem na disputa têm duração de cinco anos e oito meses (até o fim de 2019).

Para o diretor-geral da Aneel, Romeu Rufino, a tarifa máxima dá “um nível de atratividade suficiente” às geradoras. “O governo analisou todas as variáveis e entendeu que esse preço atrai os vendedores”, afirmou. Ele não quis prever se toda a demanda das distribuidoras será realmente contratada no leilão. Mas lembrou que, quanto mais bem-sucedido for o certame, menor será a necessidade de novos aportes do Tesouro ou de empréstimos da CCEE para fechar as contas deste ano.

O presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine), Luiz Fernando Vianna, acredita que o preço-teto do leilão representa um “avanço” e fez uma avaliação positiva da duração dos contratos. “Eu diria que dá para contratar, com grande probabilidade, de 50% a 60% das necessidades. Para o restante, cada gerador vai fazer sua análise.”

“Prevemos uma boa adesão de quem tem energia disponível”, diz o analista Marcos Severine, do J. P. Morgan, que tem se dedicado à análise do leilão. Para ele, usinas térmicas devem ter grande participação na oferta.

Uma das maiores dúvidas do mercado é sobre a disponibilidade de energia da Petrobras. Comenta-se no setor que a estatal teria algo entre mil MW e 1,6 mil MW de térmicas bicombustíveis (movidas a gás natural ou a óleo) descontratadas. Outra aposta é na entrada da Tractebel, que teria cerca de 250 MW descontratados, incluindo a produção da usina a gás William Arjona, em Mato Grosso do Sul.

A CPFL também deve colocar à venda boa parte da energia da hidrelétrica de Serra da Mesa, no rio Tocantins, que tem 1.275 MW de potência instalada. Na semana passada, a Aneel garantiu o direito de a CPFL de ficar com 51% da eletricidade da usina, em disputa travada com Furnas.

Fontes do setor comentam reservadamente que tem havido pressão do governo, nos bastidores, para a participação das empresas privadas. Um dos aspectos temidos pelas empresas é que haja mudanças no PLD, o preço de liquidação das diferenças, que serve de referência no mercado de curto prazo. Muitos apostam na abertura de um processo de revisão da fórmula de preços, em 2015, que possa jogar para baixo o valor do megawatt-hora no mercado “spot”. Isso pesa a favor de assegurar preços menores no leilão, mas com garantia de compra até 2019.

Nivalde de Castro, coordenador do grupo de estudos do setor elétrico da UFRJ, lembra que há sutilezas a considerar na balança de vantagens e desvantagens para as geradoras. Caso haja problemas nos reservatórios que forcem as hidrelétricas a gerar menos energia, elas serão obrigadas a repor os volumes contratados no leilão. Por esse e outros fatores de risco, ele classifica com precisão o clima do certame: “É ótimo para quem gosta de tirar férias em Las Vegas”.

 

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