Governo tenta vetar emendas ‘piratas’ em MP- Estadão

Análise do ILUMINA: A reportagem é apenas um retrato instantâneo da atuação do congresso brasileiro que já não tem nenhum pudor em defender interesses privados ao inserir emendas numa medida provisória. Os ‘jabutis’, como são chamadas, foram criados no Senado; ampliam subsídios, repassam custos para a conta de luz e chegam a ferir leis. Essa frase, retirada da reportagem, mostra para quem quiser ver a adição de 18 artigos que nada têm a ver com a intenção da MP. Quem são os autores das emendas? Que relações têm com os interessados? Mistério.

Na mesma linha de coisas bizarras, a notícia a seguir mostra como interesses comerciais tentam interferir pela via judicial nas decisões do Operador Nacional do Sistema. Reparem que a independência do Operador é princípio básico do modelo vigente. O conflito não está se dando entre o setor elétrico e outros usuários da água! Trata-se da dependência do Preço de Liquidação de Diferenças. Os participantes desse nicho dizem que ele não é o preço de mercado, sendo apenas uma “referência”. Entretanto, é impressionante que “apenas uma referência” seja o centro de uma ação judicial que, sem cerimônia, tenta alterar uma decisão do operador por claros interesses comerciais.


 

A internalização da vazão menor do rio São Francisco em Sobradinho, de 800 m³/s, e em Três Marias, de 480 m³/s, no modelo Newave para melhor refletir a realidade da operação foi judicializada. A Compass entrou com uma ação na justiça federal, pedindo a revisão da metodologia e, por antecipação de tutela, a republicação do PLD das três primeiras semanas de julho de 2016. A ação judicial ainda está correndo, sem definição da justiça. Mas tem potencial de mexer com PLD além dessas três semanas, já que a medida está sendo usada para todo este ano e foi estendida até 2017. No entendimento da Compass, a internalização da vazão menor deveria ser feita apenas no Decomp, que é de curto prazo, e não no Newave, que projeta o planejamento da operação no longo prazo. Segundo Paulo Mayon, sócio-diretor da comercializadora, a medida levou a um reajuste de 65% no preço do PLD de uma semana para outra. Mayon explicou que entrou com recursos na esfera administrativa, mas foram negados, restando apenas a justiça para tentar rever a decisão da Aneel. Uma carta da CCEE anexada ao processo mostra que a CCEE tem um alinhamento com esse pensamento. Para a Câmara, a representação deveria ser apenas nos dois primeiros meses da projeção do Newave, período igual ao usado no Decomp. A Câmara fez simulações mostrando que o PLD ficaria R$ 20,00 menor, principalmente, nos submercados Sudeste/Centro-Oeste e Sul se fosse calculado da forma que defendeu. Procurada pela reportagem, a CCEE preferiu não se manifestar sobre a ação judicial, pois ainda não tinha tomado conhecimento. Mas confirmou o conteúdo da carta enviada à Aneel. O ONS disse, através da assessoria de imprensa, que pediu para colocar a redução da vazão nos modelos, pois acredita que ela não deve retornar tão cedo ao normal, de 1.300 m³/s. O ONS afirmou ainda que a medida permite refletir melhor a realidade. Sobre a ação, disse que aguarda definição da justiça para avaliar possíveis impactos da decisão tomada. Paulo Mayon chamou atenção para o fato da medida da Aneel vir ao mesmo tempo que o Ministério de Minas e Energia realiza consultas públicas sobre a questão da formação do preço e representação da operação no modelo. Ele disse que há um alinhamento de pensamento entre os agentes sobre a questão, destoando a interpretação da Aneel. Procurada pela reportagem a Aneel não respondeu até o fechamento da edição. (Agência CanalEnergia – 21.10.2016)


 

Anne Warth,

O Estado de S.Paulo

 

BRASÍLIA – O governo se prepara para uma batalha: vetar diversos dispositivos da medida provisória do setor elétrico aprovada pelo Senado na semana passada. Uma força-tarefa dos Ministérios da Fazenda, Planejamento, Minas e Energia e Casa Civil vai trabalhar para convencer o presidente Michel Temer a barrar vários “jabutis”, como são conhecidos os temas estranhos incluídos em MPs.

O texto original, que limitava o aporte do Tesouro às distribuidoras da Eletrobras a R$ 3,5 bilhões e autorizava a privatização das empresas, tinha apenas 8 artigos, mas a proposta saiu do Congresso com 26.

Muitos dos dispositivos vão contra o discurso oficial do governo, que tenta se contrapor às políticas intervencionistas defendidas pela ex-presidente Dilma Rousseff. Algumas das emendas ampliam subsídios e repassam o custo dessas medidas para a conta de luz, e algumas chegam a violar a Lei de Falências e a Lei da Responsabilidade Fiscal.

A intenção encontra resistência na área política do governo. A ordem é, sempre que possível, aplicar a política do veto zero. Politicamente, os vetos representam uma afronta ao Congresso. O presidente Michel Temer, que foi deputado de 1994 a 2010, procura evitar entrar em conflito com os parlamentares.

Nesse cenário, a ideia é vetar os piores trechos da MP 735 e deixar passar as emendas consideradas menos prejudiciais. Entre os itens que causam incômodo e devem ser vetados, está o dispositivo que obriga a Petrobrás a pagar às distribuidoras estaduais de gás a mesma taxa de transporte cobrada dos consumidores pelo uso de suas estruturas, regra capaz de gerar um custo de R$ 7,5 bilhões à companhia. O governo vai alegar que não pode interferir em assuntos que devem ser tratados por legislação estadual.

Um dos dispositivos que devem ser vetados é o que viola a Lei de Responsabilidade Fiscal. A emenda obriga a Eletrobrás a manter a garantia dada a um contrato de gás firmado por uma de suas distribuidoras, a Amazonas Energia, mesmo depois que a empresa for privatizada. O contrato envolve a distribuidora Cigás e já foi alvo de críticas da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Tribunal de Contas da União (TCU), que apuraram sobrepreço e compras em volume acima da capacidade das usinas.

O governo não quer deixar passar a emenda que libera os geradores com obras atrasadas, que queiram desistir do negócio, do pagamento de multas e execução de garantias. Da forma como foi aprovada, a proposta teria efeito retroativo e poderia beneficiar até o grupo Bertin, que arrematou 13 usinas em leilões realizados em 2008 e nunca entregou os projetos.

Uma emenda que também deve ser vetada envolve as linhas de transmissão da Abengoa, em recuperação judicial. Pela proposta, os empreendimentos poderão ser relicitados, mas o novo operador será obrigado a carregar todos os contratos de fornecedores firmados pela Abengoa, sem qualquer corte na dívida assumida. O dispositivo viola a Lei de Falências.

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