Nível crítico de oito usinas complica geração de energia no pico do verão – Valor

Comentário: Além dos graves problemas do setor, o que é peculiar na reportagem é a não identificação das pessoas que prestam informações. “Um engenheiro que conversa regularmente com o ONS” e “Um interlocutor da Presidente Dilma Rousseff”  nos parecem pessoas que temem alguma reação que as prejudique caso explicitem seus nomes. Parece que há um clima de medo no setor elétrico, área com a marca da presidente desde 2003. 

Sobre as dificuldades relatadas, queremos apenas acrescentar que as turbinas sob baixa queda podem sofrer um efeito denominado cavitação, que pode provocar efeitos irreversíveis às pás das mesmas.

O Brasil não é o único a sofrer períodos secos. A Califórnia está atualmente passando pelo mesmo problema, mas já começou uma campanha de incentivo à economia de água e energia. Além disso, planeja instalar turbinas de baixa queda para que algumas usinas possam gerar energia sob condições críticas.

O que o Brasil está planejando? Punir quem dá declarações?


Por Daniel Rittner | De Brasília

Com a queda acentuada dos reservatórios nos últimos meses, o atendimento da demanda por energia no horário de ponta deve se transformar em um novo quebra-cabeça para o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) durante o início do verão, em dezembro. Pelo menos oito usinas hidrelétricas de médio ou grande porte estão tecnicamente impossibilitadas de produzir no máximo de sua capacidade devido ao baixo volume de água armazenado nas represas.

Em algumas usinas, o volume se encontra atualmente até 15 metros abaixo da altura necessária para fazer com que suas turbinas funcionem a plena potência, segundo levantamento obtido pelo Valor. Essa situação crítica pode ser observada em hidrelétricas como Furnas, Marimbondo, Água Vermelha, Emborcação, Nova Ponte, Três Marias, Sobradinho e Itaparica. Todas elas ficam nas regiões Sudeste e Nordeste, próximas dos centros de consumo, e são cruciais nos planos do ONS.

Nos meses de estiagem, quando a temperatura costuma ser mais amena, o reforço das térmicas normalmente compensa a baixa geração hidrelétrica e deixa o sistema em relativa tranquilidade. Em janeiro e em fevereiro, com os dias mais quentes do verão, a equação se complica. O problema se acentua no horário de ponta, logo depois do almoço, quando escritórios e residências ligam seus aparelhos de ar-condicionado com toda a força e pressionam o sistema. Em 5 de fevereiro de 2014, o recorde de demanda instantânea no país foi atingido às 15h41, com 85.708 megawatts (MW) – cerca de 15% a 20% acima do que vem sendo verificado nas últimas semanas.

Pois é justamente nessa época do ano que todas as hidrelétricas precisam estar funcionando na plenitude para dar conta do recado. Agora, com o nível dos reservatórios bastante comprometido, isso pode simplesmente não acontecer. “A operação no horário de ponta pode se tornar um caos neste verão”, diz um engenheiro que conversa regularmente com o ONS e trabalha em uma associação do setor elétrico responsável pelo levantamento.

Conforme explica esse engenheiro, a geração de energia hídrica é proporcional à altura da queda d’água e à vazão turbinada. Quanto maior for a combinação das duas, maior a produção de eletricidade. Nos momentos em que o reservatório não está cheio, é possível compensar a queda menor com uma vazão mais forte, mas isso tem um limite – e esse limite é conhecido no jargão do setor como “queda de referência”. Abaixo dela, nem adianta despejar mais água nas turbinas: o nível do reservatório simplesmente impede que haja maior geração de energia hidrelétrica.

A partir desse conceito, pode-se entender a extensão do desafio enfrentado pelo ONS. Todas as oito usinas apontadas no levantamento já operam hoje abaixo de suas quedas de referência e não podem gerar o máximo de potência para o qual foram projetadas.

O pior caso é o da hidrelétrica de Emborcação, no rio Araguari (MG), com 1.192 MW de capacidade instalada e onde o nível do reservatório está 14,9 metros inferior ao da queda de referência.

Outra situação grave é o da usina de Três Marias, no rio São Francisco (MG), com 13,7 metros de defasagem. Em Marimbondo, que tem 1.440 MW e está localizada n a divisa de São Paulo com Minas Gerais, o volume de água precisa aumentar 11,5 metros.

De acordo com os registros do ONS, a maioria desses reservatórios nunca terminou o período seco em níveis tão baixos. O governo aposta em uma hidrologia mais regular para enchê-los até o fim da próxima temporada de chuvas. Ainda que isso ocorra, é temerário dizer se as precipitações vão ser capazes de recolocar o volume de água na altura das quedas de referência até janeiro ou fevereiro, o que seria decisivo no atendimento do horário de ponta. O período de chuvas recomeça oficialmente em dezembro e termina apenas em maio.

Um interlocutor da presidente Dilma Rousseff no setor elétrico chama atenção para outro problema. Ele lembra que, na operação de qualquer sistema, é preciso sempre trabalhar com uma folga de cerca de 5% na geração de energia. Ou seja, além do necessário para atender a demanda máxima, deve-se ter uma margem de segurança de 5% na oferta. Esse adicional, conhecido como “reserva girante”, é uma blindagem essencial contra imprevistos – como o desligamento abrupto de uma usina ou a queda de um grande transformador.

O efeito de um desligamento desse tipo, quando se opera no limite da geração, pode ser um blecaute desorganizado e de proporções indesejadas. Nos Estados Unidos, sempre que a “reserva girante” está abaixo de 3%, começa a haver cortes de carga selecionados para não colocar em risco o sistema como um todo. No último verão, durante pelo menos dois dias de janeiro de 2014, o setor elétrico brasileiro chegou a trabalhar com menos de 1% de folga.

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