Gráficos e dados para pensar e entender – Capítulo I – Vale a pena ver de novo!

Por que estamos repetindo essa análise?

Pela simples razão que, tanto as notícias do setor, como as opiniões de muitos especialistas parecem desconhecer (ou desprezar?) a história recente do setor. Como esquecer o que aconteceu com o surgimento de tantos problemas?

Chamamos a atenção que todos os dados mostrados são oficiais, alguns obtidos com grande dificuldade, o que já se configuraria um absurdo tal a importância do assunto! Os números que mostramos deveriam estar disponíveis com fácil acesso. Ao invés disso, viram dados quase secretos tal a dificuldade em obtê-los.

Os maus sintomas são muitos:

– a tarifa de energia elétrica brasileira se tornou uma das mais caras do planeta.

– o setor elétrico no Brasil se transformou num campo fértil para inúmeras ações judiciais.

– conseguimos a façanha de quase termos que racionar energia em 2013. Na realidade, racionamos via preço!

– a Eletrobras é hoje uma empresa em grave situação financeira.

– o setor, tradicionalmente uma atividade segura, pode ter se tornado um emaranhado de regras tão complicadas que impossibilitam o consumidor de entender sua fatura e afasta qualquer investidor.

Se essa lista não é suficiente para despertar a atenção de todos, então a situação é ainda mais grave, pois, com certeza, outras situações caóticas tomaram conta da atenção do cidadão.

Vamos começar pelo lado concreto do mundo físico do kWh. À medida que certos mistérios venham a ser esclarecidos vamos entrar em outros temas, inclusive os políticos. Vamos por capítulos. Esse é o CAPÍTULO I.


 

Se você imagina que, no Brasil, uma usina recebe mais reais à medida que gere mais kWh, você está completamente equivocado.

Como é do conhecimento das pessoas que trabalham no setor, o Brasil adotou um sistema onde a cada usina é associado um valor de energia denominado garantia física. Cada usina vende um “share” do total. É um sistema complexo e único no planeta, sendo uma das causas da crise por que passamos.

Por exemplo, a usina de Mascarenhas de Moraes no Rio Grande tem 476 MW de potência, mas associado a ela há uma energia “garantida” de 295 MW médios. O que significa esse número? Basta multiplicá-lo pelo número de horas do ano (8760 horas) e surge o número 2.584 GWh. Essa é o pedaço da energia total atribuído à usina. É importante entender que essa energia não é gerada por ela! É apenas o “pedaço” do todo que algum mecanismo complexo associou a essa usina criando um “cartório” de certificados. Todas as usinas recebem esse valor mágico.

Essa espécie de “certificado” é o máximo que ela pode comercializar (leia-se faturar). Essa garantia física não quer dizer que usinas têm que gerar esse valor. Como exemplo máximo, térmicas no Brasil recebem R$ mesmo sem gerar ao terem sua energia substituída por geração hidráulica.

Quando se faz um leilão para que um projeto de geração seja construído, esse valor tem que estar definido previamente, pois, coisas do Brasil, as usinas comercializam essa “garantia física”. Sem ele, seria impossível calcular a rentabilidade do empreendimento e, portanto, sua viabilidade.

Esquisito? Pois tem muito mais!

O gráfico abaixo mostra a soma total de todas as garantias físicas do sistema em 3 classes. Em azul, todas as hidráulicas, em vermelho escuro, todas as térmicas e, em verde, todas as outras formas (Eólicas, pequenas hidráulicas e solar). Eixo vertical em MW médios. As “ondulações” e a “agulha” de janeiro de 2013 nós vamos explicar mais para frente, mas podemos adiantar que coisas muito estranhas estão por trás dessas variações.

O ponto importante a salientar é que de 2004 até 2016, 12 anos, a classe hidráulica aumentou sua garantia em 30%. Já a classe térmica incrementou sua garantia em 66% no mesmo período. A classe das outras formas, que no mundo já alcança percentuais significativos, aqui, está muito atrasada e representa apenas 6% do total.

Esse segundo gráfico mostra na curva branca o total da energia consumida comparada às garantias.

Como se pode ver, de 2004 até 2008, havia uma folga do consumo em relação à garantia total. De 2008 até 2014 o consumo ficou “entrelaçado” com o limite superior da garantia e, a partir de 2014, a carga se estagnou. Já mostramos que, considerado o crescimento médio do consumo, ela já “caiu” 10% (veja aqui). 

Com grande probabilidade, pessoas que não conhecem o sistema acham que o atendimento à carga é proporcional à garantia de cada tipo de usina. Portanto, de 2008 até 2014 as térmicas teriam tido um papel preponderante. Certo?

Errado!

Esse será o assunto do próximo capítulo dessa novela.

Pontos importantes:

  1. Usinas “vendem” sua “garantia”, que não é a sua geração de energia!
  2. A expansão da garantia total se deu principalmente com térmicas.
  3. O consumo total só esteve folgado em dois períodos: 2004 – 2008 e 2014 – 2016 por conta da recessão. No resto do tempo, andamos muito próximo ao limite.

Capítulo II

 

 

 

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